domingo, 7 de fevereiro de 2016

O que você está lendo?

Bem, se você leu a pergunta-título desta postagem é porque você está lendo esse texto. Mas, a pergunta é mais ampla: que livro, ou livros, você está lendo no momento? O termo momento, aqui, pode variar desde hoje até nos últimos três meses.

Recentemente, eu li A lógica do consumo, escrita por um conhecedor do mundo da propaganda e com dinheiro suficiente para se engajar numa pesquisa neurocientífica. O tema do livro encontra um paralelo numa série da TV fechada chamada Truques da Mente. É impressionante como a neurociência vem sendo utilizada para orientar hábitos de consumo que interessam às grandes corporações. Na publicidade, esse conhecimento neurocientífico é usado na escolha das cores do produto, temas de fundo e imagens que irão aparecer num comercial de TV, num outdoor, num panfleto e vários outros veículos publicitários.

Você deve lembrar, por exemplo, das imagens horripilantes que aparecem nos maços de cigarros numa tentativa de desestimular o consumo de tabaco. Você nunca se perguntou como é que a poderosa indústria de cigarros parece aceitar isso de modo tão complacente? Essas imagens estão aparecendo em zilhões de maços de cigarros em vários países de todo o mundo. Sem nenhum tipo de reação contrária das grandes corporações? Algo que, cedo ou tarde, ficaríamos conhecendo pela TV como uma disputa legal sem precedentes, ou coisa assim? Bem, isso não acontece porque essas imagens, de acordo com o autor de A lógica do consumo, estimula (!?) o uso do tabaco. Impensável, não é mesmo?

Boa parte do que aparece nas propagandas não tem você como alvo, mas sim, o seu cérebro. Nossas reações inconscientes é que determinam prioritariamente se vamos ou não vamos consumir algo. Queiramos ou não, quem decide isso não somos nós; é o nosso cérebro. Mas se é o meu cérebro que decide, então não sou eu quem decido? Não. Isso só seria verdade se a decisão fosse consciente. Mas ela não é. Quando seu cérebro é estimulado por imagens (visão), cheiros (olfato), barulhos (audição), texturas (tato) e gostos (paladar), ele reage sempre para, primeiramente, preservar o ser, ou seja: você. E ele faz isso num nível tão detalhado e sutil que nós simplesmente não conseguimos perceber. E são essas reações que nos levam a comprar ou não comprar algo. Conhecer essas respostas do cérebro a estímulos externos é um campo fértil de pesquisas da neurociência e que tem sido, por razões óbvias, muito explorado pelos marqueteiros mais bem sucedidos.

Assim, ao olhar para a sua estante de livros (não técnicos!), não se assuste se notar que há algum tipo de padrão de cor nas capas. O mesmo vale para o seu armário de roupas. E também não estranhe a existência de uma padaria dentro de um supermercado. O cheiro do pão quentinho está ali para fazer você comprar mais daquilo que não precisa. Não é você decidindo: é o seu cérebro.

Não me assustarei se, algum dia, alguém baixar um livro no kindle e, de repente, começar a sentir aquele cheirinho de papel que só os livros impressos têm. Vai dar uma vontade em tanto de ler!

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Até a próxima.


Um comentário:

  1. Uma iniciativa no centrinho de uma pacata cidade fez-me gastar toda minha mísera bolsa universitária em livros.
    Muito imaginativo voei seco sobre Poes e Kafkas (porquê kaftas são espetinhos de carne moída), ávido por imaginação comprei um HQ biográfico de Nietzche.
    Não tenho costume de falar sobre o que leio porque pessoas não gostam de ouvir. Pois é, mesmo na universidade, convivo com pessoa que nunca leu um livro sequer, e por falta de imaginação de certos indivíduos, confesso que pensei isso de alguns professores também.
    O livro que mais me emocionou foi Moby Dick de Melville. Um épico em pleno século XIX. Aprendi o charme da ironia urbana com Rubem Fonseca. Tive pesadelo após ler "Descida ao Maelstrom" do Poe. Refleti sobre minha condição lendo Sartre e sobre minha existência e a relação com as outras existências lendo os Filósofos da Suspeita; Marx, Nietzche e Feud. Suspirei com Vinícius, Pessoa, Drummond, Maiakovsky, Shakespeare. Compreendi liberdade com Emma Goldman, Bakunin, Malatesta, Proudhon. Ri da simplicidade com Bukowsky e Kerouac.
    Talvez tenha sido para compensar minha frustração com matemática, devorei os clássicos brasileiros na época dos vestibulares: Eça, Graciliano , Sabino, Jorge Amado...
    Um dia, uma pessoa que considero muito disse " Quantos anos de vida vai te acrescentar saber por que existem moluscos preservados em pedras?"
    Pessoas vivem a vida toda sem experimentar ou compreender uma experiência subjetiva e pessoal como a literatura ou a arte. Atribuem males da humanidade à uma guerra mesquinha entre divindades, e a uma suposta "natureza humana". Nada mais subjetivo e vago que isso...
    A estupidez é confundida com ignorância e torna-se virtude em nosso meio, cujos valores para uma sociedade justa e próspera estão invertidos. Certa vez fui eliminado de uma entrevista de emprego porque não consegui escrever um texto com 15 linhas cujo título era "Quem é você?". Seis anos depois e ainda não saberia escrever uma linha sobre essa pergunta.
    O fruto da ignorância cientifica é a ignorância política ( entre outros males). Um povo ignorante elege o pior tipo de político possível, e neste caso flertamos com a sofrível frase " Cada povo tem o Governo que merece". Mas como disse Caetano "Gente é pra brilhar e não pra morrer de fome", parte de nós portanto, que possuímos experiências com o encantamento da descoberta combater com as armas da argumentação e do pensamento cético o preconceito contra o conhecimento.

    Suas aulas foram as melhores até aqui.

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